Escrevi por motivos pessoais, para
refletir um acontecimento pessoal e divido-o com vocês. Imaginei uma
conversa com uma nova amiga. A ela dedico e a quem eu me desentendi
também.
O
Sermão de uma Amiga
Já
não havia mais felicidade nos olhos dele. Sentia-se cansado,
desiludido e por um motivo considerado fútil para a maioria das
pessoas mais próximas e íntimas. No sofá, com o chimarrão a uma
mão e um caderno colocado à direita, ele lançou um olhar sem graça
para fora da janela de sua casa. O barulho, ou melhor, rugido do trem
vindo e desacelerando antes de chegar à pontezinha fez o jovem rapaz
sair de seu devaneio, de sua fuga para evitar pensar na realidade re
em que o perturbava fazia meses. Sua nova amiga, que o havia
socorrido naquele dia infeliz perguntou com uma voz doce e
demonstrando preocupação:
-O
que houve? Tu ainda estás pensando nela?
-Sim,
e fiz analogias. -Respondeu melancolicamente ele.
Baixou
sua cabeça e pensou que aquele seria o momento de contar uma
história não contada e quiçá refletir sobre si mesmo. A garota,
dezenove anos, ajudá-lo-ia a fazer isso. Naquele instante, o vento
soprou pela janela e uma mecha dos longos e brilhantes cabelos loiros
dela caiu sobre seus olhos. Ele sorriu. Achou graça quando ela os
afastou e ficou encabulada com aquele olhar repentino.
-O
que foi?!
Houve
constrangimento. Ela era linda, principalmente quando surgia a imagem
de a garota estar acariciando um gatinho de estimação sobre a
barriga dela. Fazer o quê? Porém, ele afastou os pensamentos
íntimos de sua mente e passou a cuia a ela. Lá fora, os vagões
continuavam a passar, o que lhe fez lembrar do título de sua cidade:
“Princesa das Pontes” e da inutilidade daquela ferrovia ao
município.
-Tu
vais me dar outro sermão?
-De
fato. Ela já lhe falou sobre a “opção sexual” dela e tu tens
de entender a necessidade do afastamento. Tu a cansaste, talvez ela
te odeie e sinta aversão, mas e daí? Todos passam por desilusões
amorosas e a única coisa que aquela menina havia te garantido era a
amizade, mas cobraste demais, demonstraste egocentrismo,
possessividade, roubaste o espaço dela e falhaste no respeito. Ela
te deu algo bom, sem exigir nada e fizeste o oposto. Isso odiável,
mas servirá como uma escola, a qual precisas inserir-te.,
As
últimas palavras pareceram consoladoras, mas não aliviava a
sensação de perda e de que jamais voltaria a se apaixonar. Tinha
surgido um novo temor. Se novamente sentisse o mesmo por outra menina
e ela não recebesse bem seus sentimentos. Lembrou-se vagamente de
uma das aulas de uma disciplina da graduação quando estudou sobre
Freud e num debate tornou-se consciente da existência de um padrão
inconsciente que orienta a atração. Era o que queria contar,
relacionando com uma paixão boba de escola. Preferiu não contar e
escutar o último conselho.
-Buscar
apoio psicológico e psiquiátrico te fará bem, mas melhor ainda é
que tu comeces a sair, continue a ler teus livros, beba e escreva.
Diários ajudam. Ah, e se voltar a falar dela, você apanha!
Ele
sorriu. O mate que a garota bebia não tinha mais espuma, nem vapor,
porém o gosto amargo e suave continuava. Ao devolver, ela lançou um
sorriso cômico. Talvez nunca cumprisse a ameaça, mas seria melhor
não esperar para ver. O assunto, assim, foi concluído. O trem
distanciava-se e escutava-se um barulho que gradualmente diminuía.
Pelo bairro, paralelo à ferrovia, os pássaros voando, pousados
sobre os postes e perambulando sem permissão pelos telhados cantavam
alegremente.
Autor: Itacir
José Santim
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