Autor: Itacir José Santim
O ônibus vindo de Porto Alegre parou
ao lado da rodoviária situada na avenida principal de Muçum, pois
não há box e nem espaço para um, o que causa transtornos ao
transito de carros. Regina desembarcou tranquilamente e sorriu
contente ao ver uma velha amiga lhe esperando. Elas se abraçaram.
Depois de cinco anos morando na capital, tendo concluindo com honras
a graduação em História, voltava para casa a fim de assumir o
cargo de professora na escola em que tinha estudado. Da praça, a
música atraiu as garotas.
A praça estava repleta de barracas e
um grande palco havia sido montado sobre o “lonão” da avenida
principal. Acontecia a Semana Farroupilha, maior evento
tradicionalista da região. Mulheres de vestido de prensa e homens de
pilcha dançavam um fandango naquele instante, enquanto um público
atento assistia. Pelo acampamento, muitas rodas de chimarrão tinham
se constituído e de mãos a cuia passava. Regina, ao ver tudo,
demonstrava seu encanto através de risos e palavras denotando
saudades.
-Gostaria de vir de noite e rever os
outros também.
-Vamos marcar.
À noite, as garotas reviram os velhos
amigos e divertiram-se. Elas conheceram alguns rapazes que
demonstraram estar afins, mas Regina manteve-se indiferente. Uma
triste lembrança surgiu em sua mente. Ícaro. Lembrava-se vagamente,
pois, por algum motivo, essa memória foi suprimida. Conheceu-o fez
dez anos no mesmo evento.
-Aline, eu vou embora.
-Por quê?
-Não me sentindo bem e amanhã tenho
de trabalhar.
-Entendo. Tenha uma boa noite.
...
O primeiro dia de aula. Regina foi bem
acolhida, conheceu o Projeto Político Pedagógico e ouviu da sua
colega e ex-professora Mariane de História as atividades realizadas
até aqueles dias. Isso devia passar segurança, mas não aconteceu.
Sozinhas, antes da primeira aula, elas conversaram. Mariane quis
demonstrou preocupação:
-O que passa nessa sua cabecinha, Re?
-Lembrei-me do Ícaro e de tudo que
aconteceu. Talvez fosse melhor não ter voltado. Sinto-me com medo.
-Aqueles dias passaram e não há mais
nada com que se preocupar, a não ser com suas turmas. Você gostava
dele, foi bom, mas em nossas vidas as pessoas são passageiras. Quiçá
você não conheça alguém tão incrível amanhã?
A sirene soou. Lá, na primeira sala
de aula do primeiro prédio, ela estava estática, com medo de abrir
a porta e enfrentar o outro lado. Alunos cheios de energia loucos
para aprender e outros teimosos, resistentes, esperavam-na. Ela
fechou os olhos e pensou estar indo para outro lugar, até que a
professora Mariane tocou-a e fê-la voltar à consciência.
-Entre. -Disse a professora Mariane.
Os alunos demonstraram boa
receptividade. Regina inovava nas aulas com suas ideias e instigava a
curiosidade neles. Passaram dias, semanas e meses. Ela se habituou ao
trabalho, apaixonou-se pela profissão e começou a sentir segura.
Uma ilusão para outra história não contada.